Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo


Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo

"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "...


foto: Paulo BaretaMarco Camargo e os segredos de um grande ídolo
Marco Camargo nome de destaque no júri de Ídolos
"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "Ídolos" se mostra bem diferente da maneira que se porta na bancada do programa. Acompanhado de Supla e Fafá de Belém, Marco pode ser considerado o voto de minerva dos candidatos, afinal, experiência para julgar tantos concorrentes, ele tem de sobra e sua trajetória retrata bem isso.
Em entrevista ao Shopping News, o produtor contou do atual momento da música brasileira, o que ele acha primordial em um ídolo e como foi chegar ao cargo de diretor musical em uma das maiores emissoras do Brasil. Acompanhe:
Quando desperta essa vocação para a música?
Acho que você nasce com o dom. É uma coisa que falo até no próprio Ídolos e sou muito convicto disso. Quando era pequeno, ganhei uma bola de couro no Natal e o meu vizinho ganhou uma escaleta. Achei muito legal e perguntei se ele queria trocar. Comecei a tirar várias músicas. Meu paipercebeu isso e me deu uma escaleta maior. Depois ganhei uma de verdade. Em seguida ele me deu um órgão. Na época a sensação era o Rick Wakeman, e eu tocava o disco dele meio que do meu jeito. Meu pai me deu um upgrade de novo e ganhei um piano. Depois passei a tocar violão também.
Você teve alguns discos gravados, certo? Fale sobre esses trabalhos.
Com 13 anos montei uma banda cover de Beatles chamada Comitatus e fiquei com isso até uns 18 anos. Durante um show, uma pessoa da EMI me convidou para lançar um compacto. Aceitei e fiquei muito feliz, mas os caras da banda não quiseram. Eles queriam continuar com Beatles e eu respeitei. Gravei três compactos e depois três LPs.
E o trabalho como compositor, quando surgiu?
Quando eu gravei os discos, já compunha. E aí começaram artistas de todos os gêneros a me gravar. Até que Zezé Di Camargo gravou uma composição minha chamada "Cama de Capim". Quando ele gravou essa música, na época eu não tinha noção de valores autorais, mas se fossem nos dias de hoje, os showzinhos que eu fazia cobrava mil reais. E quando fui editar a música para o Zezé, ganhei R$ 80 mil. Então comecei a compor profissionalmente. Além do dom e de gostar, sem hipocrisia, dava dinheiro.
Como você entrou para a área de produção?
Mandava minhas composições para os artistas com uma demo, que tinha bateria, piano eletrônico, entre outros instrumentos. Então chegava com essa configuração, e eles pediam para que fosse ao estúdio orientar o produtor e arranjador a fazer a mesma base. Comecei a produzir minhas músicas e depois de outros cantores. Teve Ivete Sangalo, Sandy e Júnior, Paulo Ricardo, Ed Motta. Tenho mais de 500 músicas gravadas.
Você trabalhou com o Roberto Carlos. Como foi essa experiência?
Um dia recebi uma ligação do próprio Roberto Carlos. Ele me disse que estava vendo alguns dos meus trabalhos e me convidou para participar do novo disco dele. Sem hipocrisia, ninguém nunca acha que o Roberto Carlos vai chamar. Prontamente eu aceitei. Comecei a produzir o Roberto e até hoje sei que ele não precisava da minha produção, mas acho delicado da parte dele manter isso, porque apesar de saber tudo o que quer, ele te ouve. Pude aprender muito com ele.
Você ganhou dois prêmios Grammys em trabalhos com o Roberto Carlos, certo?
Fiz um disco do padre Marcelo Rossi cantando músicas do Roberto. Ele autorizou, desde que eu fizesse essa produção. Fiz esse disco em 2002 e ganhei o Grammy. Esse foi o primeiro. Em 2006 ganhei com o próprio Roberto Carlos, um disco que fizemos algumas bases, com músicas sertanejas cantadas por ele. Na minha vida, não é coincidência que os dois tenham o Roberto Carlos.
Nessa época existiam muitos compositores?
A guerra era violenta. Os números que te dei eram reais. Se fosse hoje, dava para comprar uma BMW nova por cada música. Comprei apartamento e carro só compondo, na época que a composição nos favorecia. O problema hoje não é a música, é como a comercializam. Autores e inventores geniais, existem e vão continuar existindo. O artista deve ser artista. Quem tem que saber como ele deve ganhar dinheiro com a sua obra, é a indústria.
Muitos artistas não estão associados com a gravadora, produtora. Todo esse papel quem fazia era o produtor. Hoje o artista tem que estar metido em tudo?
O que acontece é que a receita diminuiu muito. Então ele quer vender, ser assessor e fazer tudo para dividir menos. Mas ele esquece que enquanto faz tudo isso, está deixando de compor e criar, o que de fato as pessoas esperam dele. Por isso é tão difícil encontrar um artista excelente. Junto a isso você tem o comércio musical. Antigamente, artistas como Roberto Carlos, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Xororó, Zezé, tocavam em todas as rádios. Hoje, a segmentação não deixa com que se atinja uma massa em um curto espaço de tempo. Se você sai de um programa da Globo, você não fala em outra emissora. Isso é uma hipocrisia. Não importa de onde ele veio, o conceito tem que ser um: o artista ser bom ou ruim.
Como você chegou à televisão?
O diretor do Ídolos, Wanderley Villa Nova, me ligou e disse que iria ter uma temporada do reality, que eu já assistia e acompanhava. Ele falou que iam colocar novos jurados e disse que queria que eu participasse. Achei que era um desafio e topei. Falei que estava dentro. No primeiro ano, fomos eu, Calainho e Paula Lima. Passado um ano e meio, a direção me chamou e disse que precisava de um administrador dentro da emissora. Então me convidaram para ser o diretor musical.
Hoje a música é um grande influenciador nas novelas. Muitas vezes os personagens são identificados pela música, certo?
Exatamente. A música é sempre muito importante em tudo, ela é a trilha sonora da vida. Se você pegar o casamento, tem aquela música que marcou, sem contar a marcha nupcial, que também é uma música . Sempre falo o seguinte, pega o beijo da novela e coloca de fundo Endless Love, e depois na mesma cena coloca Severina Xique Xique. É completamente outra. A música tem a magia de te fazer viajar no tempo. Insisto para os meus filhos aprenderem música não para serem músicos, mas acho que a pessoa que convive com a música, é um ser humano melhor. Ela é mais sensível e o mundo precisa de sensibilidade. Em pouco tempo, o profissional mais bem remunerado será aquele que sabe ler os olhos, não a tela.
Como foi fazer esse trabalho de direção musical para o Balacobaco, na novela da Record?
É uma novela que mistura todos os ritmos. Ao mesmo tempo que é fácil, é difícil, porque quando você trata de uma novela muito popular, você também começa a receber popularescos e mau gosto. Ser popular é bem diferente de ter mau gosto. E muitas pessoas confundem isso. Hoje está na moda vários ritmos com pouca letra. Tem coisas que podem estar na moda, se tem pessoas para consumir, não está errado. O que está errado é quando a pessoa começa a achar que isso é Beatles, Roberto Carlos.
O reflexo dessa sociedade consumista pode ser visto no Ídolos?
Muitos ficam no modismo. Sempre digo que para ser um ídolo você precisa ter a sua verdade. Se ele é um roqueiro nato, vai cantar uma música sertaneja, mas vai entender que é um rock. De alguma forma ele tem os ingredientes do rock. Ninguém procura uma imitação, procura algo inédito. O motivo é simples, dificilmente você se emociona com algo que já viu.
Explique um pouco das regras do jogo. Como funciona o Ídolos?
Este ano foram 104 mil inscrições. Daí temos 85 pessoas viajando com a gente, sendo dessas umas 25 de produção ou que trabalham com música. São 10 tendas que atendem todas as 104 mil pessoas. Todos são escutados, não por nós, mas por essa equipe. Eles fazem uma filtragem de quem pode chegar até nós. Por estado, nós jurados, ouvimos em média umas 300 pessoas. Como é um reality, eles usam muito bem nosso momento de fadiga para colocar um personagem nada a ver na audição. Aí que a gente acaba falando de uma maneira mais áspera, porque não é fácil escutar 300 pessoas e entrar um cara para fazer nada.
Mas como que passam esses personagens?
Essa é a parte do entretenimento. Você tem dois candidatos que servem para o programa: o de entretenimento e o muito bom. Isso também serve para que as pessoas em casa possam separar e ver que esse cara é muito bom. Os medianos podem embolar o meio de campo, para atrapalhar o público votar certo.
Você acredita que o público vota errado algumas vezes?
Muitas vezes. Porque existem dois tipos de votação. A artística, que deveria ser a correta e independe da classe social, cor e problema físico. E existe o voto história, que vira novela. Quando as pessoas votam pela história, fico indignado porque o coitado que não tem problema físico ou não nasceu de uma família tão pobre, não tem culpa que canta para caramba. É muita injustiça do público 'crucificar' esse cara por não ter um problema.
Existe cobrança quanto aos vencedores de serem grandes ídolos?
Essa cobrança de torná-lo um grande ídolo, sempre vai existir, e respondo que a gente escolhe o melhor daquele que se inscreveu. Não significa que o melhor se inscreveu. Se tenho no top 10 só medianos, vai ganhar o melhor dos medianos. Ele nunca vai ser bom. Se ele não é bom não vai ser ídolo. É uma explicação simples.
No American Idol, por exemplo, você tem nomes como Kelly Clarkson, Jordin Sparks e outros que se tornaram fenômenos. Por que aqui no Brasil isso não acontece?
O problema não é só estrutura que é diferente, mas a gente não teve a Kelly Clarkson se inscrevendo aqui. Se ela se inscrevesse aqui, seria ídolo também.
Existe preconceito contra vencedores de realities?
Sim. Se você ganhar na Record, não faz mais nenhuma emissora. É lógico que existe preconceito, mas todo mundo fica com o olho fechado. Bota o cara que ganhou o Ídolos em todas as emissoras para você ver se vira sucesso ou não. É uma pena, porque cada vez que você faz um ídolo, o Brasil ganha. Você tem um ícone, uma pessoa para levantar nossa bandeira lá fora. É alguém que vai emocionar. É covardia um profissional de mídia fechar a porta para quem não sabe abrir.
Fale sobre Ídolos Kids.
Está me surpreendendo pela visão das crianças. Elas também têm que cantar. Acho interessante que elas já vêm semiartistas. Nesse aspecto, a Internet favorece muito. Isso pode ser uma dificuldade também, uma vez que tantas pessoas têm acesso a esse tipo de informação. Para você se destacar fica muito mais difícil.
A naturalidade é levada em conta?
Sim. E tem outro fator, porque a voz dessas crianças vai mudar. Até uns 15, 16 anos, muda. Então você tem que passar a naturalidade com afinação. Mas pode ser que uma criança bem afinada fique desafinada na pré-adolescência. Quem é ídolo já nasce cantando. Um exemplo é a Sandy, que é espetacular. Quem não lembra dela cantando Maria Chiquinha? Era uma criança superafinada e continua até hoje.
Essa fórmula de realities musicais, virou uma tendência?
Isso é mundial. Nos Estados Unidos, os programas com maior audiência são: American Idol, Got Talent, The Voice e X Factor. Mas eles são inteligentes, porque eles colocam um concorrendo com o outro. Por exemplo, se você vai até fevereiro eu entro em março. Isso acho inteligente e produtivo. No Brasil vale a guerra e audiência a qualquer custo. Lá eles priorizam mais o canto do que o entretenimento e aqui às vezes isso é difícil.
Você acredita que o mercado brasileiro da música passa por uma crise?
A crise é como se comercializa a música, não a música em si. Ela nunca esteve e nunca estará em crise, porque sempre terão pessoas maravilhosas compondo, escrevendo e cantando. O que modifica é onde essas pessoas se apresentam, os espaços e investimentos.
Nestes mais de 20 anos de estrada, como você avalia as mudanças da música?
Acho que o que mais mudou foi a qualidade. Ela ainda existe, mas em número muito menor. Então se você tinha 100%, você poderia ter uns 60% de músicas boas e 40% de músicas não tão boas assim. Hoje você tem 70, 80% de músicas não tão boas.

Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo


Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo

"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "...

Alessandra Gardezani / Davi Brandão
foto: Paulo BaretaMarco Camargo e os segredos de um grande ídolo
Marco Camargo nome de destaque no júri de Ídolos
"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "Ídolos" se mostra bem diferente da maneira que se porta na bancada do programa. Acompanhado de Supla e Fafá de Belém, Marco pode ser considerado o voto de minerva dos candidatos, afinal, experiência para julgar tantos concorrentes, ele tem de sobra e sua trajetória retrata bem isso.
Em entrevista ao Shopping News, o produtor contou do atual momento da música brasileira, o que ele acha primordial em um ídolo e como foi chegar ao cargo de diretor musical em uma das maiores emissoras do Brasil. Acompanhe:
Quando desperta essa vocação para a música?
Acho que você nasce com o dom. É uma coisa que falo até no próprio Ídolos e sou muito convicto disso. Quando era pequeno, ganhei uma bola de couro no Natal e o meu vizinho ganhou uma escaleta. Achei muito legal e perguntei se ele queria trocar. Comecei a tirar várias músicas. Meu paipercebeu isso e me deu uma escaleta maior. Depois ganhei uma de verdade. Em seguida ele me deu um órgão. Na época a sensação era o Rick Wakeman, e eu tocava o disco dele meio que do meu jeito. Meu pai me deu um upgrade de novo e ganhei um piano. Depois passei a tocar violão também.
Você teve alguns discos gravados, certo? Fale sobre esses trabalhos.
Com 13 anos montei uma banda cover de Beatles chamada Comitatus e fiquei com isso até uns 18 anos. Durante um show, uma pessoa da EMI me convidou para lançar um compacto. Aceitei e fiquei muito feliz, mas os caras da banda não quiseram. Eles queriam continuar com Beatles e eu respeitei. Gravei três compactos e depois três LPs.
E o trabalho como compositor, quando surgiu?
Quando eu gravei os discos, já compunha. E aí começaram artistas de todos os gêneros a me gravar. Até que Zezé Di Camargo gravou uma composição minha chamada "Cama de Capim". Quando ele gravou essa música, na época eu não tinha noção de valores autorais, mas se fossem nos dias de hoje, os showzinhos que eu fazia cobrava mil reais. E quando fui editar a música para o Zezé, ganhei R$ 80 mil. Então comecei a compor profissionalmente. Além do dom e de gostar, sem hipocrisia, dava dinheiro.
Como você entrou para a área de produção?
Mandava minhas composições para os artistas com uma demo, que tinha bateria, piano eletrônico, entre outros instrumentos. Então chegava com essa configuração, e eles pediam para que fosse ao estúdio orientar o produtor e arranjador a fazer a mesma base. Comecei a produzir minhas músicas e depois de outros cantores. Teve Ivete Sangalo, Sandy e Júnior, Paulo Ricardo, Ed Motta. Tenho mais de 500 músicas gravadas.
Você trabalhou com o Roberto Carlos. Como foi essa experiência?
Um dia recebi uma ligação do próprio Roberto Carlos. Ele me disse que estava vendo alguns dos meus trabalhos e me convidou para participar do novo disco dele. Sem hipocrisia, ninguém nunca acha que o Roberto Carlos vai chamar. Prontamente eu aceitei. Comecei a produzir o Roberto e até hoje sei que ele não precisava da minha produção, mas acho delicado da parte dele manter isso, porque apesar de saber tudo o que quer, ele te ouve. Pude aprender muito com ele.
Você ganhou dois prêmios Grammys em trabalhos com o Roberto Carlos, certo?
Fiz um disco do padre Marcelo Rossi cantando músicas do Roberto. Ele autorizou, desde que eu fizesse essa produção. Fiz esse disco em 2002 e ganhei o Grammy. Esse foi o primeiro. Em 2006 ganhei com o próprio Roberto Carlos, um disco que fizemos algumas bases, com músicas sertanejas cantadas por ele. Na minha vida, não é coincidência que os dois tenham o Roberto Carlos.
Nessa época existiam muitos compositores?
A guerra era violenta. Os números que te dei eram reais. Se fosse hoje, dava para comprar uma BMW nova por cada música. Comprei apartamento e carro só compondo, na época que a composição nos favorecia. O problema hoje não é a música, é como a comercializam. Autores e inventores geniais, existem e vão continuar existindo. O artista deve ser artista. Quem tem que saber como ele deve ganhar dinheiro com a sua obra, é a indústria.
Muitos artistas não estão associados com a gravadora, produtora. Todo esse papel quem fazia era o produtor. Hoje o artista tem que estar metido em tudo?
O que acontece é que a receita diminuiu muito. Então ele quer vender, ser assessor e fazer tudo para dividir menos. Mas ele esquece que enquanto faz tudo isso, está deixando de compor e criar, o que de fato as pessoas esperam dele. Por isso é tão difícil encontrar um artista excelente. Junto a isso você tem o comércio musical. Antigamente, artistas como Roberto Carlos, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Xororó, Zezé, tocavam em todas as rádios. Hoje, a segmentação não deixa com que se atinja uma massa em um curto espaço de tempo. Se você sai de um programa da Globo, você não fala em outra emissora. Isso é uma hipocrisia. Não importa de onde ele veio, o conceito tem que ser um: o artista ser bom ou ruim.
Como você chegou à televisão?
O diretor do Ídolos, Wanderley Villa Nova, me ligou e disse que iria ter uma temporada do reality, que eu já assistia e acompanhava. Ele falou que iam colocar novos jurados e disse que queria que eu participasse. Achei que era um desafio e topei. Falei que estava dentro. No primeiro ano, fomos eu, Calainho e Paula Lima. Passado um ano e meio, a direção me chamou e disse que precisava de um administrador dentro da emissora. Então me convidaram para ser o diretor musical.
Hoje a música é um grande influenciador nas novelas. Muitas vezes os personagens são identificados pela música, certo?
Exatamente. A música é sempre muito importante em tudo, ela é a trilha sonora da vida. Se você pegar o casamento, tem aquela música que marcou, sem contar a marcha nupcial, que também é uma música . Sempre falo o seguinte, pega o beijo da novela e coloca de fundo Endless Love, e depois na mesma cena coloca Severina Xique Xique. É completamente outra. A música tem a magia de te fazer viajar no tempo. Insisto para os meus filhos aprenderem música não para serem músicos, mas acho que a pessoa que convive com a música, é um ser humano melhor. Ela é mais sensível e o mundo precisa de sensibilidade. Em pouco tempo, o profissional mais bem remunerado será aquele que sabe ler os olhos, não a tela.
Como foi fazer esse trabalho de direção musical para o Balacobaco, na novela da Record?
É uma novela que mistura todos os ritmos. Ao mesmo tempo que é fácil, é difícil, porque quando você trata de uma novela muito popular, você também começa a receber popularescos e mau gosto. Ser popular é bem diferente de ter mau gosto. E muitas pessoas confundem isso. Hoje está na moda vários ritmos com pouca letra. Tem coisas que podem estar na moda, se tem pessoas para consumir, não está errado. O que está errado é quando a pessoa começa a achar que isso é Beatles, Roberto Carlos.
O reflexo dessa sociedade consumista pode ser visto no Ídolos?
Muitos ficam no modismo. Sempre digo que para ser um ídolo você precisa ter a sua verdade. Se ele é um roqueiro nato, vai cantar uma música sertaneja, mas vai entender que é um rock. De alguma forma ele tem os ingredientes do rock. Ninguém procura uma imitação, procura algo inédito. O motivo é simples, dificilmente você se emociona com algo que já viu.
Explique um pouco das regras do jogo. Como funciona o Ídolos?
Este ano foram 104 mil inscrições. Daí temos 85 pessoas viajando com a gente, sendo dessas umas 25 de produção ou que trabalham com música. São 10 tendas que atendem todas as 104 mil pessoas. Todos são escutados, não por nós, mas por essa equipe. Eles fazem uma filtragem de quem pode chegar até nós. Por estado, nós jurados, ouvimos em média umas 300 pessoas. Como é um reality, eles usam muito bem nosso momento de fadiga para colocar um personagem nada a ver na audição. Aí que a gente acaba falando de uma maneira mais áspera, porque não é fácil escutar 300 pessoas e entrar um cara para fazer nada.
Mas como que passam esses personagens?
Essa é a parte do entretenimento. Você tem dois candidatos que servem para o programa: o de entretenimento e o muito bom. Isso também serve para que as pessoas em casa possam separar e ver que esse cara é muito bom. Os medianos podem embolar o meio de campo, para atrapalhar o público votar certo.
Você acredita que o público vota errado algumas vezes?
Muitas vezes. Porque existem dois tipos de votação. A artística, que deveria ser a correta e independe da classe social, cor e problema físico. E existe o voto história, que vira novela. Quando as pessoas votam pela história, fico indignado porque o coitado que não tem problema físico ou não nasceu de uma família tão pobre, não tem culpa que canta para caramba. É muita injustiça do público 'crucificar' esse cara por não ter um problema.
Existe cobrança quanto aos vencedores de serem grandes ídolos?
Essa cobrança de torná-lo um grande ídolo, sempre vai existir, e respondo que a gente escolhe o melhor daquele que se inscreveu. Não significa que o melhor se inscreveu. Se tenho no top 10 só medianos, vai ganhar o melhor dos medianos. Ele nunca vai ser bom. Se ele não é bom não vai ser ídolo. É uma explicação simples.
No American Idol, por exemplo, você tem nomes como Kelly Clarkson, Jordin Sparks e outros que se tornaram fenômenos. Por que aqui no Brasil isso não acontece?
O problema não é só estrutura que é diferente, mas a gente não teve a Kelly Clarkson se inscrevendo aqui. Se ela se inscrevesse aqui, seria ídolo também.
Existe preconceito contra vencedores de realities?
Sim. Se você ganhar na Record, não faz mais nenhuma emissora. É lógico que existe preconceito, mas todo mundo fica com o olho fechado. Bota o cara que ganhou o Ídolos em todas as emissoras para você ver se vira sucesso ou não. É uma pena, porque cada vez que você faz um ídolo, o Brasil ganha. Você tem um ícone, uma pessoa para levantar nossa bandeira lá fora. É alguém que vai emocionar. É covardia um profissional de mídia fechar a porta para quem não sabe abrir.
Fale sobre Ídolos Kids.
Está me surpreendendo pela visão das crianças. Elas também têm que cantar. Acho interessante que elas já vêm semiartistas. Nesse aspecto, a Internet favorece muito. Isso pode ser uma dificuldade também, uma vez que tantas pessoas têm acesso a esse tipo de informação. Para você se destacar fica muito mais difícil.
A naturalidade é levada em conta?
Sim. E tem outro fator, porque a voz dessas crianças vai mudar. Até uns 15, 16 anos, muda. Então você tem que passar a naturalidade com afinação. Mas pode ser que uma criança bem afinada fique desafinada na pré-adolescência. Quem é ídolo já nasce cantando. Um exemplo é a Sandy, que é espetacular. Quem não lembra dela cantando Maria Chiquinha? Era uma criança superafinada e continua até hoje.
Essa fórmula de realities musicais, virou uma tendência?
Isso é mundial. Nos Estados Unidos, os programas com maior audiência são: American Idol, Got Talent, The Voice e X Factor. Mas eles são inteligentes, porque eles colocam um concorrendo com o outro. Por exemplo, se você vai até fevereiro eu entro em março. Isso acho inteligente e produtivo. No Brasil vale a guerra e audiência a qualquer custo. Lá eles priorizam mais o canto do que o entretenimento e aqui às vezes isso é difícil.
Você acredita que o mercado brasileiro da música passa por uma crise?
A crise é como se comercializa a música, não a música em si. Ela nunca esteve e nunca estará em crise, porque sempre terão pessoas maravilhosas compondo, escrevendo e cantando. O que modifica é onde essas pessoas se apresentam, os espaços e investimentos.
Nestes mais de 20 anos de estrada, como você avalia as mudanças da música?
Acho que o que mais mudou foi a qualidade. Ela ainda existe, mas em número muito menor. Então se você tinha 100%, você poderia ter uns 60% de músicas boas e 40% de músicas não tão boas assim. Hoje você tem 70, 80% de músicas não tão boas.

Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo


Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo

"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "...

Alessandra Gardezani / Davi Brandão
foto: Paulo BaretaMarco Camargo e os segredos de um grande ídolo
Marco Camargo nome de destaque no júri de Ídolos
"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "Ídolos" se mostra bem diferente da maneira que se porta na bancada do programa. Acompanhado de Supla e Fafá de Belém, Marco pode ser considerado o voto de minerva dos candidatos, afinal, experiência para julgar tantos concorrentes, ele tem de sobra e sua trajetória retrata bem isso.
Em entrevista ao Shopping News, o produtor contou do atual momento da música brasileira, o que ele acha primordial em um ídolo e como foi chegar ao cargo de diretor musical em uma das maiores emissoras do Brasil. Acompanhe:
Quando desperta essa vocação para a música?
Acho que você nasce com o dom. É uma coisa que falo até no próprio Ídolos e sou muito convicto disso. Quando era pequeno, ganhei uma bola de couro no Natal e o meu vizinho ganhou uma escaleta. Achei muito legal e perguntei se ele queria trocar. Comecei a tirar várias músicas. Meu paipercebeu isso e me deu uma escaleta maior. Depois ganhei uma de verdade. Em seguida ele me deu um órgão. Na época a sensação era o Rick Wakeman, e eu tocava o disco dele meio que do meu jeito. Meu pai me deu um upgrade de novo e ganhei um piano. Depois passei a tocar violão também.
Você teve alguns discos gravados, certo? Fale sobre esses trabalhos.
Com 13 anos montei uma banda cover de Beatles chamada Comitatus e fiquei com isso até uns 18 anos. Durante um show, uma pessoa da EMI me convidou para lançar um compacto. Aceitei e fiquei muito feliz, mas os caras da banda não quiseram. Eles queriam continuar com Beatles e eu respeitei. Gravei três compactos e depois três LPs.
E o trabalho como compositor, quando surgiu?
Quando eu gravei os discos, já compunha. E aí começaram artistas de todos os gêneros a me gravar. Até que Zezé Di Camargo gravou uma composição minha chamada "Cama de Capim". Quando ele gravou essa música, na época eu não tinha noção de valores autorais, mas se fossem nos dias de hoje, os showzinhos que eu fazia cobrava mil reais. E quando fui editar a música para o Zezé, ganhei R$ 80 mil. Então comecei a compor profissionalmente. Além do dom e de gostar, sem hipocrisia, dava dinheiro.
Como você entrou para a área de produção?
Mandava minhas composições para os artistas com uma demo, que tinha bateria, piano eletrônico, entre outros instrumentos. Então chegava com essa configuração, e eles pediam para que fosse ao estúdio orientar o produtor e arranjador a fazer a mesma base. Comecei a produzir minhas músicas e depois de outros cantores. Teve Ivete Sangalo, Sandy e Júnior, Paulo Ricardo, Ed Motta. Tenho mais de 500 músicas gravadas.
Você trabalhou com o Roberto Carlos. Como foi essa experiência?
Um dia recebi uma ligação do próprio Roberto Carlos. Ele me disse que estava vendo alguns dos meus trabalhos e me convidou para participar do novo disco dele. Sem hipocrisia, ninguém nunca acha que o Roberto Carlos vai chamar. Prontamente eu aceitei. Comecei a produzir o Roberto e até hoje sei que ele não precisava da minha produção, mas acho delicado da parte dele manter isso, porque apesar de saber tudo o que quer, ele te ouve. Pude aprender muito com ele.
Você ganhou dois prêmios Grammys em trabalhos com o Roberto Carlos, certo?
Fiz um disco do padre Marcelo Rossi cantando músicas do Roberto. Ele autorizou, desde que eu fizesse essa produção. Fiz esse disco em 2002 e ganhei o Grammy. Esse foi o primeiro. Em 2006 ganhei com o próprio Roberto Carlos, um disco que fizemos algumas bases, com músicas sertanejas cantadas por ele. Na minha vida, não é coincidência que os dois tenham o Roberto Carlos.
Nessa época existiam muitos compositores?
A guerra era violenta. Os números que te dei eram reais. Se fosse hoje, dava para comprar uma BMW nova por cada música. Comprei apartamento e carro só compondo, na época que a composição nos favorecia. O problema hoje não é a música, é como a comercializam. Autores e inventores geniais, existem e vão continuar existindo. O artista deve ser artista. Quem tem que saber como ele deve ganhar dinheiro com a sua obra, é a indústria.
Muitos artistas não estão associados com a gravadora, produtora. Todo esse papel quem fazia era o produtor. Hoje o artista tem que estar metido em tudo?
O que acontece é que a receita diminuiu muito. Então ele quer vender, ser assessor e fazer tudo para dividir menos. Mas ele esquece que enquanto faz tudo isso, está deixando de compor e criar, o que de fato as pessoas esperam dele. Por isso é tão difícil encontrar um artista excelente. Junto a isso você tem o comércio musical. Antigamente, artistas como Roberto Carlos, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Xororó, Zezé, tocavam em todas as rádios. Hoje, a segmentação não deixa com que se atinja uma massa em um curto espaço de tempo. Se você sai de um programa da Globo, você não fala em outra emissora. Isso é uma hipocrisia. Não importa de onde ele veio, o conceito tem que ser um: o artista ser bom ou ruim.
Como você chegou à televisão?
O diretor do Ídolos, Wanderley Villa Nova, me ligou e disse que iria ter uma temporada do reality, que eu já assistia e acompanhava. Ele falou que iam colocar novos jurados e disse que queria que eu participasse. Achei que era um desafio e topei. Falei que estava dentro. No primeiro ano, fomos eu, Calainho e Paula Lima. Passado um ano e meio, a direção me chamou e disse que precisava de um administrador dentro da emissora. Então me convidaram para ser o diretor musical.
Hoje a música é um grande influenciador nas novelas. Muitas vezes os personagens são identificados pela música, certo?
Exatamente. A música é sempre muito importante em tudo, ela é a trilha sonora da vida. Se você pegar o casamento, tem aquela música que marcou, sem contar a marcha nupcial, que também é uma música . Sempre falo o seguinte, pega o beijo da novela e coloca de fundo Endless Love, e depois na mesma cena coloca Severina Xique Xique. É completamente outra. A música tem a magia de te fazer viajar no tempo. Insisto para os meus filhos aprenderem música não para serem músicos, mas acho que a pessoa que convive com a música, é um ser humano melhor. Ela é mais sensível e o mundo precisa de sensibilidade. Em pouco tempo, o profissional mais bem remunerado será aquele que sabe ler os olhos, não a tela.
Como foi fazer esse trabalho de direção musical para o Balacobaco, na novela da Record?
É uma novela que mistura todos os ritmos. Ao mesmo tempo que é fácil, é difícil, porque quando você trata de uma novela muito popular, você também começa a receber popularescos e mau gosto. Ser popular é bem diferente de ter mau gosto. E muitas pessoas confundem isso. Hoje está na moda vários ritmos com pouca letra. Tem coisas que podem estar na moda, se tem pessoas para consumir, não está errado. O que está errado é quando a pessoa começa a achar que isso é Beatles, Roberto Carlos.
O reflexo dessa sociedade consumista pode ser visto no Ídolos?
Muitos ficam no modismo. Sempre digo que para ser um ídolo você precisa ter a sua verdade. Se ele é um roqueiro nato, vai cantar uma música sertaneja, mas vai entender que é um rock. De alguma forma ele tem os ingredientes do rock. Ninguém procura uma imitação, procura algo inédito. O motivo é simples, dificilmente você se emociona com algo que já viu.
Explique um pouco das regras do jogo. Como funciona o Ídolos?
Este ano foram 104 mil inscrições. Daí temos 85 pessoas viajando com a gente, sendo dessas umas 25 de produção ou que trabalham com música. São 10 tendas que atendem todas as 104 mil pessoas. Todos são escutados, não por nós, mas por essa equipe. Eles fazem uma filtragem de quem pode chegar até nós. Por estado, nós jurados, ouvimos em média umas 300 pessoas. Como é um reality, eles usam muito bem nosso momento de fadiga para colocar um personagem nada a ver na audição. Aí que a gente acaba falando de uma maneira mais áspera, porque não é fácil escutar 300 pessoas e entrar um cara para fazer nada.
Mas como que passam esses personagens?
Essa é a parte do entretenimento. Você tem dois candidatos que servem para o programa: o de entretenimento e o muito bom. Isso também serve para que as pessoas em casa possam separar e ver que esse cara é muito bom. Os medianos podem embolar o meio de campo, para atrapalhar o público votar certo.
Você acredita que o público vota errado algumas vezes?
Muitas vezes. Porque existem dois tipos de votação. A artística, que deveria ser a correta e independe da classe social, cor e problema físico. E existe o voto história, que vira novela. Quando as pessoas votam pela história, fico indignado porque o coitado que não tem problema físico ou não nasceu de uma família tão pobre, não tem culpa que canta para caramba. É muita injustiça do público 'crucificar' esse cara por não ter um problema.
Existe cobrança quanto aos vencedores de serem grandes ídolos?
Essa cobrança de torná-lo um grande ídolo, sempre vai existir, e respondo que a gente escolhe o melhor daquele que se inscreveu. Não significa que o melhor se inscreveu. Se tenho no top 10 só medianos, vai ganhar o melhor dos medianos. Ele nunca vai ser bom. Se ele não é bom não vai ser ídolo. É uma explicação simples.
No American Idol, por exemplo, você tem nomes como Kelly Clarkson, Jordin Sparks e outros que se tornaram fenômenos. Por que aqui no Brasil isso não acontece?
O problema não é só estrutura que é diferente, mas a gente não teve a Kelly Clarkson se inscrevendo aqui. Se ela se inscrevesse aqui, seria ídolo também.
Existe preconceito contra vencedores de realities?
Sim. Se você ganhar na Record, não faz mais nenhuma emissora. É lógico que existe preconceito, mas todo mundo fica com o olho fechado. Bota o cara que ganhou o Ídolos em todas as emissoras para você ver se vira sucesso ou não. É uma pena, porque cada vez que você faz um ídolo, o Brasil ganha. Você tem um ícone, uma pessoa para levantar nossa bandeira lá fora. É alguém que vai emocionar. É covardia um profissional de mídia fechar a porta para quem não sabe abrir.
Fale sobre Ídolos Kids.
Está me surpreendendo pela visão das crianças. Elas também têm que cantar. Acho interessante que elas já vêm semiartistas. Nesse aspecto, a Internet favorece muito. Isso pode ser uma dificuldade também, uma vez que tantas pessoas têm acesso a esse tipo de informação. Para você se destacar fica muito mais difícil.
A naturalidade é levada em conta?
Sim. E tem outro fator, porque a voz dessas crianças vai mudar. Até uns 15, 16 anos, muda. Então você tem que passar a naturalidade com afinação. Mas pode ser que uma criança bem afinada fique desafinada na pré-adolescência. Quem é ídolo já nasce cantando. Um exemplo é a Sandy, que é espetacular. Quem não lembra dela cantando Maria Chiquinha? Era uma criança superafinada e continua até hoje.
Essa fórmula de realities musicais, virou uma tendência?
Isso é mundial. Nos Estados Unidos, os programas com maior audiência são: American Idol, Got Talent, The Voice e X Factor. Mas eles são inteligentes, porque eles colocam um concorrendo com o outro. Por exemplo, se você vai até fevereiro eu entro em março. Isso acho inteligente e produtivo. No Brasil vale a guerra e audiência a qualquer custo. Lá eles priorizam mais o canto do que o entretenimento e aqui às vezes isso é difícil.
Você acredita que o mercado brasileiro da música passa por uma crise?
A crise é como se comercializa a música, não a música em si. Ela nunca esteve e nunca estará em crise, porque sempre terão pessoas maravilhosas compondo, escrevendo e cantando. O que modifica é onde essas pessoas se apresentam, os espaços e investimentos.
Nestes mais de 20 anos de estrada, como você avalia as mudanças da música?
Acho que o que mais mudou foi a qualidade. Ela ainda existe, mas em número muito menor. Então se você tinha 100%, você poderia ter uns 60% de músicas boas e 40% de músicas não tão boas assim. Hoje você tem 70, 80% de músicas não tão boas.

Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo


Marco Camargo e os segredos de um grande ídolo

"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "...

Alessandra Gardezani / Davi Brandão
foto: Paulo BaretaMarco Camargo e os segredos de um grande ídolo
Marco Camargo nome de destaque no júri de Ídolos
"A música é a trilha sonora da vida". Assim definiu o produtor e músico Marco Camargo. Sensível, calmo e gentil, o diretor musical da rede Record e jurado do reality show musical "Ídolos" se mostra bem diferente da maneira que se porta na bancada do programa. Acompanhado de Supla e Fafá de Belém, Marco pode ser considerado o voto de minerva dos candidatos, afinal, experiência para julgar tantos concorrentes, ele tem de sobra e sua trajetória retrata bem isso.
Em entrevista ao Shopping News, o produtor contou do atual momento da música brasileira, o que ele acha primordial em um ídolo e como foi chegar ao cargo de diretor musical em uma das maiores emissoras do Brasil. Acompanhe:
Quando desperta essa vocação para a música?
Acho que você nasce com o dom. É uma coisa que falo até no próprio Ídolos e sou muito convicto disso. Quando era pequeno, ganhei uma bola de couro no Natal e o meu vizinho ganhou uma escaleta. Achei muito legal e perguntei se ele queria trocar. Comecei a tirar várias músicas. Meu paipercebeu isso e me deu uma escaleta maior. Depois ganhei uma de verdade. Em seguida ele me deu um órgão. Na época a sensação era o Rick Wakeman, e eu tocava o disco dele meio que do meu jeito. Meu pai me deu um upgrade de novo e ganhei um piano. Depois passei a tocar violão também.
Você teve alguns discos gravados, certo? Fale sobre esses trabalhos.
Com 13 anos montei uma banda cover de Beatles chamada Comitatus e fiquei com isso até uns 18 anos. Durante um show, uma pessoa da EMI me convidou para lançar um compacto. Aceitei e fiquei muito feliz, mas os caras da banda não quiseram. Eles queriam continuar com Beatles e eu respeitei. Gravei três compactos e depois três LPs.
E o trabalho como compositor, quando surgiu?
Quando eu gravei os discos, já compunha. E aí começaram artistas de todos os gêneros a me gravar. Até que Zezé Di Camargo gravou uma composição minha chamada "Cama de Capim". Quando ele gravou essa música, na época eu não tinha noção de valores autorais, mas se fossem nos dias de hoje, os showzinhos que eu fazia cobrava mil reais. E quando fui editar a música para o Zezé, ganhei R$ 80 mil. Então comecei a compor profissionalmente. Além do dom e de gostar, sem hipocrisia, dava dinheiro.
Como você entrou para a área de produção?
Mandava minhas composições para os artistas com uma demo, que tinha bateria, piano eletrônico, entre outros instrumentos. Então chegava com essa configuração, e eles pediam para que fosse ao estúdio orientar o produtor e arranjador a fazer a mesma base. Comecei a produzir minhas músicas e depois de outros cantores. Teve Ivete Sangalo, Sandy e Júnior, Paulo Ricardo, Ed Motta. Tenho mais de 500 músicas gravadas.
Você trabalhou com o Roberto Carlos. Como foi essa experiência?
Um dia recebi uma ligação do próprio Roberto Carlos. Ele me disse que estava vendo alguns dos meus trabalhos e me convidou para participar do novo disco dele. Sem hipocrisia, ninguém nunca acha que o Roberto Carlos vai chamar. Prontamente eu aceitei. Comecei a produzir o Roberto e até hoje sei que ele não precisava da minha produção, mas acho delicado da parte dele manter isso, porque apesar de saber tudo o que quer, ele te ouve. Pude aprender muito com ele.
Você ganhou dois prêmios Grammys em trabalhos com o Roberto Carlos, certo?
Fiz um disco do padre Marcelo Rossi cantando músicas do Roberto. Ele autorizou, desde que eu fizesse essa produção. Fiz esse disco em 2002 e ganhei o Grammy. Esse foi o primeiro. Em 2006 ganhei com o próprio Roberto Carlos, um disco que fizemos algumas bases, com músicas sertanejas cantadas por ele. Na minha vida, não é coincidência que os dois tenham o Roberto Carlos.
Nessa época existiam muitos compositores?
A guerra era violenta. Os números que te dei eram reais. Se fosse hoje, dava para comprar uma BMW nova por cada música. Comprei apartamento e carro só compondo, na época que a composição nos favorecia. O problema hoje não é a música, é como a comercializam. Autores e inventores geniais, existem e vão continuar existindo. O artista deve ser artista. Quem tem que saber como ele deve ganhar dinheiro com a sua obra, é a indústria.
Muitos artistas não estão associados com a gravadora, produtora. Todo esse papel quem fazia era o produtor. Hoje o artista tem que estar metido em tudo?
O que acontece é que a receita diminuiu muito. Então ele quer vender, ser assessor e fazer tudo para dividir menos. Mas ele esquece que enquanto faz tudo isso, está deixando de compor e criar, o que de fato as pessoas esperam dele. Por isso é tão difícil encontrar um artista excelente. Junto a isso você tem o comércio musical. Antigamente, artistas como Roberto Carlos, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Xororó, Zezé, tocavam em todas as rádios. Hoje, a segmentação não deixa com que se atinja uma massa em um curto espaço de tempo. Se você sai de um programa da Globo, você não fala em outra emissora. Isso é uma hipocrisia. Não importa de onde ele veio, o conceito tem que ser um: o artista ser bom ou ruim.
Como você chegou à televisão?
O diretor do Ídolos, Wanderley Villa Nova, me ligou e disse que iria ter uma temporada do reality, que eu já assistia e acompanhava. Ele falou que iam colocar novos jurados e disse que queria que eu participasse. Achei que era um desafio e topei. Falei que estava dentro. No primeiro ano, fomos eu, Calainho e Paula Lima. Passado um ano e meio, a direção me chamou e disse que precisava de um administrador dentro da emissora. Então me convidaram para ser o diretor musical.
Hoje a música é um grande influenciador nas novelas. Muitas vezes os personagens são identificados pela música, certo?
Exatamente. A música é sempre muito importante em tudo, ela é a trilha sonora da vida. Se você pegar o casamento, tem aquela música que marcou, sem contar a marcha nupcial, que também é uma música . Sempre falo o seguinte, pega o beijo da novela e coloca de fundo Endless Love, e depois na mesma cena coloca Severina Xique Xique. É completamente outra. A música tem a magia de te fazer viajar no tempo. Insisto para os meus filhos aprenderem música não para serem músicos, mas acho que a pessoa que convive com a música, é um ser humano melhor. Ela é mais sensível e o mundo precisa de sensibilidade. Em pouco tempo, o profissional mais bem remunerado será aquele que sabe ler os olhos, não a tela.
Como foi fazer esse trabalho de direção musical para o Balacobaco, na novela da Record?
É uma novela que mistura todos os ritmos. Ao mesmo tempo que é fácil, é difícil, porque quando você trata de uma novela muito popular, você também começa a receber popularescos e mau gosto. Ser popular é bem diferente de ter mau gosto. E muitas pessoas confundem isso. Hoje está na moda vários ritmos com pouca letra. Tem coisas que podem estar na moda, se tem pessoas para consumir, não está errado. O que está errado é quando a pessoa começa a achar que isso é Beatles, Roberto Carlos.
O reflexo dessa sociedade consumista pode ser visto no Ídolos?
Muitos ficam no modismo. Sempre digo que para ser um ídolo você precisa ter a sua verdade. Se ele é um roqueiro nato, vai cantar uma música sertaneja, mas vai entender que é um rock. De alguma forma ele tem os ingredientes do rock. Ninguém procura uma imitação, procura algo inédito. O motivo é simples, dificilmente você se emociona com algo que já viu.
Explique um pouco das regras do jogo. Como funciona o Ídolos?
Este ano foram 104 mil inscrições. Daí temos 85 pessoas viajando com a gente, sendo dessas umas 25 de produção ou que trabalham com música. São 10 tendas que atendem todas as 104 mil pessoas. Todos são escutados, não por nós, mas por essa equipe. Eles fazem uma filtragem de quem pode chegar até nós. Por estado, nós jurados, ouvimos em média umas 300 pessoas. Como é um reality, eles usam muito bem nosso momento de fadiga para colocar um personagem nada a ver na audição. Aí que a gente acaba falando de uma maneira mais áspera, porque não é fácil escutar 300 pessoas e entrar um cara para fazer nada.
Mas como que passam esses personagens?
Essa é a parte do entretenimento. Você tem dois candidatos que servem para o programa: o de entretenimento e o muito bom. Isso também serve para que as pessoas em casa possam separar e ver que esse cara é muito bom. Os medianos podem embolar o meio de campo, para atrapalhar o público votar certo.
Você acredita que o público vota errado algumas vezes?
Muitas vezes. Porque existem dois tipos de votação. A artística, que deveria ser a correta e independe da classe social, cor e problema físico. E existe o voto história, que vira novela. Quando as pessoas votam pela história, fico indignado porque o coitado que não tem problema físico ou não nasceu de uma família tão pobre, não tem culpa que canta para caramba. É muita injustiça do público 'crucificar' esse cara por não ter um problema.
Existe cobrança quanto aos vencedores de serem grandes ídolos?
Essa cobrança de torná-lo um grande ídolo, sempre vai existir, e respondo que a gente escolhe o melhor daquele que se inscreveu. Não significa que o melhor se inscreveu. Se tenho no top 10 só medianos, vai ganhar o melhor dos medianos. Ele nunca vai ser bom. Se ele não é bom não vai ser ídolo. É uma explicação simples.
No American Idol, por exemplo, você tem nomes como Kelly Clarkson, Jordin Sparks e outros que se tornaram fenômenos. Por que aqui no Brasil isso não acontece?
O problema não é só estrutura que é diferente, mas a gente não teve a Kelly Clarkson se inscrevendo aqui. Se ela se inscrevesse aqui, seria ídolo também.
Existe preconceito contra vencedores de realities?
Sim. Se você ganhar na Record, não faz mais nenhuma emissora. É lógico que existe preconceito, mas todo mundo fica com o olho fechado. Bota o cara que ganhou o Ídolos em todas as emissoras para você ver se vira sucesso ou não. É uma pena, porque cada vez que você faz um ídolo, o Brasil ganha. Você tem um ícone, uma pessoa para levantar nossa bandeira lá fora. É alguém que vai emocionar. É covardia um profissional de mídia fechar a porta para quem não sabe abrir.
Fale sobre Ídolos Kids.
Está me surpreendendo pela visão das crianças. Elas também têm que cantar. Acho interessante que elas já vêm semiartistas. Nesse aspecto, a Internet favorece muito. Isso pode ser uma dificuldade também, uma vez que tantas pessoas têm acesso a esse tipo de informação. Para você se destacar fica muito mais difícil.
A naturalidade é levada em conta?
Sim. E tem outro fator, porque a voz dessas crianças vai mudar. Até uns 15, 16 anos, muda. Então você tem que passar a naturalidade com afinação. Mas pode ser que uma criança bem afinada fique desafinada na pré-adolescência. Quem é ídolo já nasce cantando. Um exemplo é a Sandy, que é espetacular. Quem não lembra dela cantando Maria Chiquinha? Era uma criança superafinada e continua até hoje.
Essa fórmula de realities musicais, virou uma tendência?
Isso é mundial. Nos Estados Unidos, os programas com maior audiência são: American Idol, Got Talent, The Voice e X Factor. Mas eles são inteligentes, porque eles colocam um concorrendo com o outro. Por exemplo, se você vai até fevereiro eu entro em março. Isso acho inteligente e produtivo. No Brasil vale a guerra e audiência a qualquer custo. Lá eles priorizam mais o canto do que o entretenimento e aqui às vezes isso é difícil.
Você acredita que o mercado brasileiro da música passa por uma crise?
A crise é como se comercializa a música, não a música em si. Ela nunca esteve e nunca estará em crise, porque sempre terão pessoas maravilhosas compondo, escrevendo e cantando. O que modifica é onde essas pessoas se apresentam, os espaços e investimentos.
Nestes mais de 20 anos de estrada, como você avalia as mudanças da música?
Acho que o que mais mudou foi a qualidade. Ela ainda existe, mas em número muito menor. Então se você tinha 100%, você poderia ter uns 60% de músicas boas e 40% de músicas não tão boas assim. Hoje você tem 70, 80% de músicas não tão boas.